MUSEU
Se houvesse
um museu
de momentos
um museu
de momentos
um inventário
de instantes
de instantes
um monumento
para eventos
que nunca aconteceram
para eventos
que nunca aconteceram
se houvesse
um arquivo
de agoras
um catálogo
de acasos
um arquivo
de agoras
um catálogo
de acasos
que guardasse por exemplo
o dia em que te vi atravessar a rua
com teu vestido mais veloz
o dia em que te vi atravessar a rua
com teu vestido mais veloz
se houvesse
um acervo
de acidentes
um acervo
de acidentes
um herbário
de esperas
de esperas
um zoológico
de ferozes alegrias
de ferozes alegrias
se houvesse
um depósito
de detalhes
um depósito
de detalhes
um álbum
de fotografias
nunca tiradas
de fotografias
nunca tiradas
APARADOR
Sonho que estou de volta
ao primeiro apartamento
quando éramos jovens e tínhamos
muito menos coisas
e nem sabíamos que já éramos
felizes como pensávamos que seríamos
estás na minha memória
jovem e alegre como numa fotografia
talvez ainda mais jovem e mais alegre
mais jovem do que jamais foste
e mais alegre
usas uma presilha
no cabelo castanho e comprido
invejo a presilha
que está tão mais próxima do que eu
do teu pensamento
e dos teus cabelos
da tua cabeça de cabelo e pensamento
e invejo a fotografia
que se parece tanto contigo
talvez mais ainda do que tu mesma
ouço as juntas que estalam
como portas batendo
sou hoje uma chaleira, uma pá, uns óculos
esquecidos sobre o aparador
sou o aparador
esquecido de mim mesmo
sobre o aparador está tua fotografia
que nos sobreviverá
ao primeiro apartamento
quando éramos jovens e tínhamos
muito menos coisas
e nem sabíamos que já éramos
felizes como pensávamos que seríamos
estás na minha memória
jovem e alegre como numa fotografia
talvez ainda mais jovem e mais alegre
mais jovem do que jamais foste
e mais alegre
usas uma presilha
no cabelo castanho e comprido
invejo a presilha
que está tão mais próxima do que eu
do teu pensamento
e dos teus cabelos
da tua cabeça de cabelo e pensamento
e invejo a fotografia
que se parece tanto contigo
talvez mais ainda do que tu mesma
ouço as juntas que estalam
como portas batendo
sou hoje uma chaleira, uma pá, uns óculos
esquecidos sobre o aparador
sou o aparador
esquecido de mim mesmo
sobre o aparador está tua fotografia
que nos sobreviverá
ANA MARTINS MARQUES, 35, é autora de "Da Arte das Armadilhas" (Companhia das Letras), finalista Prêmio Portugal Telecom de Literatura deste ano na categoria poesia.
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